Thursday, March 05, 2009

re-homeostetica (2)


Marginalia: o que se desloca nas margens é o esplendor ginecológico – obstetricismo? a estética no consultório? O que fazia temer o ornamento, na geração de Loos e outros eram os corrimentos vaginais do ornamental – a misoginia e o machismo atravessam a modernidade arquitectónica como coisa genital e casta – isto é, tendencialmente minimalista. Hoje o environment é anfíbio e multissexual – a fotografia e a palavra instalaram-se nele. Há um filão pornoecológico que é puxado pelos corcéis ditos maléficos da publicidade. A alta-definição parece puxar os mínimos detalhes e as coisas microscópicas para um primeiro-plano. As anatomias internas fazem-se vísiveis e rivalizam na sua mortalidade e texturas com os mais brandos olhares e inflexões de voz...

Do entulho da Mnésis e da velhacaria pressionante das citações o que é que se pode retirar? Já não são nem os monumentos nem um espaço para reverenciar heróis ou meditar. Os museus tornaram-se portáteis e infra-magros e a tradição do desrespeito está há muito prisioneira do seu paradigma de falsas e adolescentes infracções. Quase tudo foi «conquistado» nos primeiros ready-mades de Duchamp – o resto do mundo é que mudou muito, assim como a heroificação de um acto de provocação infantil ou de relaxado cepticismo.

É o fluxo das imagens o sumo da vida ou apenas uma instância para fundar uma arqueologia bárbara? Ou será que as imagens são dispensáveis? Ou é a arte, como tradição de suspeição que ameaça o carácter afrodisíaco e mágico das imagens?

O reverso do firmamento, o reverso quer do caos, quer da ordem pré-establecida - a metacatástrofe, isto é a complexidade como o que é paradisíaco! Mas os mitos enganaram-nos durante muito tempo ao confeccionarem para o mundo ìnicios demasiado frios e despovoados.

O espírito do concreto enraíza-nos na grande colagem movediça que é o mundo: não a mentalidade que aprisiona, digere e caga submetendo-nos a obscuros poderes conjunturais (!) mas o que adere e capta e decide e flexibiliza e adapta e adopta.

A relevância do individual exilado nas suas regras internas e conduzido para os próprios túmulos da sua «consciência» e poética, desfaz-se dos chumaços gnósticos e participa em workshops espontâneos e na interactividade combativa de grupos produtivos.



Reverenciar a dúvida como antiquíssimo método diabólico-pascaliano (vidé Job e o Discurso do Método): erística-erótica. Há uma luxúria barroca que saliva intestinalmente nas perguntas mais ferozes. Sublinhar, sem medo de velhos friquismos a «experiência constante». Body sim, mas body bulding não! Estender a tenda caosmológica da Doxa. Ampliar os nexos e as ligações perigosas com cautelas manhosas ou com os avacalhantes métodos aleatórios.

O princípio gerador é local. Compreender o gerado e os aparentes mecanismos de gestação tem sido útil para fazer um acompanhamento sábio pelas orquestrações da consciência. Mas acompanhar é também ir para a cama com.

Trata-se de actos de identificação? Ou apenas de vigília? Transplantamos algo nas transmutações orgânicas... damos corda à consciência intergaláctica... ou só damos à nossa conscienciazinha provinciana?

Consciência é flexibilidade & harmoniosa coerência da concorrência da singularização das multiplicidades. (ufff!)

A obstinação é o maior inimigo do homem: o sacerdote e a padronização, a clericalização das mentalidades (e o seu prolongamento na máquina burocrática!) e os dilemas morais irreversíveis... piores que a grande dama escarlate da babilónia!

Cadeias itinerantes. O nosso propósito não é venerar a citação mas abatê-la a médio prazo, como domesticado fantasma e vítima sacrificial. É um acto pouco romântico?... E linguareja-se a partir dessa destruição... há fluxos comunicacionais um pouco flutuantes (elementares ou/e complexos). È claro que não podemos ignorar as falhas (o não-programado, o relutante e o refutante), as incontinentes dislexias e outros subterfúgios filhos da teia da multideterminação. Mas há uma candura infantil no fundo, um vigoroso balbuciamento pré-babélico, uma autenticidade sem calão.

Prescuta-se na multimoralidade a libação orgástica que percorre sonoramente os multiversos? Tumultuária? Nunca uma rendição à passividade exocéptica, mas a certeza-dúvida nutritiva.


A vida é a sem-origem representável em todas as coisas (a representação é um atributo da artephysis – não há presença pura, porque toda a suposta presença transita de uma (re)«presença» anterior).


Os multiversos autoengendrando-se, encurvando-se para além do Polilogos e do Metapathos, circonvulsionando-se em secretas hipercosmogonias: À notre seul désir!

As florestas telerrizomáticas dão a entender que o espaço comunicacional se despiu das finalidades, mas sabemos que progride por etapas para zonas que de previamente desconhecidas se convertem em hábitos enfadonhos – a noção de território e de environment articula-se ainda no nosso corpo semi-protético, mas coloniza espumosamente quer as zonas ditas reais, quer as zonas supostamente virtuais. A telematização da civilização é a forma-formula neo-colonial mais acabada. Haverá focos de resistência, zonas de guerrilha anti-telemática sem cair em más paródias de Che Guevara? As civilizações foram decapitadas das suas ligações com a velha physis, e as cabeças civilizacionais fazem parte de um espólio venerável que até aos antropólogos (caçadores de cabeças por empatia) pouco interessa. No entanto as imagens e metáforas fantasmáticas continuam a circular nos adereços mais insignificantes da pop-culture (na moda, na piercingmania, etc.). Há uma antropofagia adiada – a velha hamartia de que falava Aristóteles. Não sabemos como serão possíveis as catarses... haverá mais sangue do que espectacularidade?




É do humús das mortes civilizacionais que tudo se conjuga para esta renascença mais complexa, cujo ícone cultural é desde há muito o Finnegans Wake joyceano – suprematismo-infraísmo lúdico de alegorias post-paradoxais, poliateísmo stockaustico, tantrismo trans-digital...

É tão fácil como encenar séries – mas já não estamos no estado das tautologias básicas à moda de Wittegenstein ou de Soll Lewitt – as tautologias, e os derivados combinatórios partem de estados cada vez mais impuros – a miscigenação segue menos uma lógica linear do que saltos nebulosos e dissimulantes. É como se as nuvens sonoras de Xenakis ou as colagens-sobreposições «aleatórias» de Cage se acasalassem com as melodias indianas e não fossem totalmente insensíveis às várias mansões da tonalidade e da determinação ou o cançonetismo brejeiro-ruídoso-sentimental...

Já temos uma argila ontológica da mais sensível civilidade! Mas não vamos cantar disparates éticos nem lançar anátemas arregimentadas em cima do joelho. É certo que idealmente, um luxuoso «comunismo» aboliria o máximo das assimetrias sociais, mas também exploraria a maximização das assimetrias na artephysis... a liquidação em curso das velhas solidariedades de todo o tipo é um prelúdio à liquidação do estado clássico, e inclusive a da ideia de um estado planetário regulador – actualmente é a pseudo-auto-regulação da produtividade e dos mercados que dita cada vez mais as flutuações económicas, com os estados a tentarem acudir às crises em desesperado remendo... a cada vez maior impotência das nações para resolver quer as questões políticas e quer as económicas leva-nos a uma semi-anarquia sem pensos de new deals, porque ninguém se compromete senão num endividamento que ignoramos no que pode dar. Não sabemos se será doce ou amarga esta anarcordem, fruto do apetite civilizacional pelo crescimento económico imoderado...

1 comment:

v said...

O que gostas de ler?